Trocando de roupa para o Banquete Nupcial

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Caminhada para o Céu

sábado, 16 de fevereiro de 2013

"Sobre a terra devemos santificar-nos fazendo a vontade dos outros e não a nossa, porque aquela é para nós a vontade de Deus”.




A VIDA PRODIGIOSA DE SÃO GERALDO MAGELA

CAPÍTULO XV 

Apostolado entre as religiosas 

O amor ardente que fez de Geraldo o amigo, salvador e guia dos pecadores, impeliu-o a dedicar-se de modo especial aos que aspiram a trilhar os caminhos da perfeição dentro dos conventos. Entre todos ocupavam o primeiro lugar as religiosas que levavam vida austera e recolhida em comunidades bem formadas. O servo de Deus fazia delas o mais alto conceito. À luz da fé pareciam-lhe em mais rica escala a relação nupcial da alma com Deus por meio dos votos; eram-lhe cópias vivas da SS. Virgem.

“Não vos admireis, escreve em uma carta à superiora de um convento, que vos escrevo com tanta alegria; vejo em vós as verdadeiras esposas de Jesus Cristo, e isso enche-me de tanta veneração, que quisera constantemente entreter-me convosco; além disso (o que me comove até o íntimo do coração) vós me representais, como esposas do Senhor, a SS. Virgem Mãe de Deus”.

Já mencionamos o zelo, com que Geraldo se fatigava para povoar os conventos de almas generosas. Mas não era só isso; pois que como também já tivemos ocasião de referir, tomou parte ativa na santificação de diversas religiosas. Embora essa atividade pareça estar em contradição com o estado, humilde posição e vocação do santo, não podemos duvidar que Deus a queria, e que ela fazia parte da missão extraordinária que o santo tinha de cumprir.

Se o primeiro impulso para isso procedesse dele, se ele mesmo se insinuasse e o exigisse dos superiores, poder-se-ia realmente duvidar da genuinidade dessa vocação. Ora nada disso se deu.
O primeiro impulso para essa atividade nos conventos de religiosas, deram-no os bispos que, cientes da sua capacidade extraordinária, o recomendaram aos diversos claustros e viram seus esforços sempre coroados do mais brilhante êxito.

Geraldo submeteu-se à autoridade da Igreja ao iniciar esse seu apostolado. Acresce o consentimento de seus superiores imediatos, Pe. Cafaro, Pe. Fiocchi e Santo Afonso — homens que receavam a sombra do inconveniente, e era competentes para o conhecer e julgar.

Para os superiores prova evidente dessa vocação de Geraldo, eram o bom espírito, a sabedoria e humildade do Irmão, os resultados estupendos produzidos por sua atividade, o testemunho de todos que tiveram ocasião de observá-lo e são unânimes em tecer louvores ao zelo e prudência por ele patenteados nesses trabalhos extraordinários.
Embora pareça estranho, que um pobre irmão leigo se apresente como guia espiritual e mais ainda, guia espiritual de freiras — não se pode pôr em dúvida a sua vocação para esse trabalho.

O santo realizou esse seu trabalho de direção espiritual em numerosos conventos. Já mencionamos acima os seus resultados no convento das clarissas em Muro, o modo como inflamou de zelo, em Corato, o convento das dominicanas e edificou, com seu exemplo e doutrina, o claustro das beneditinas; o que ele fez para as religiosas dessa mesma ordem em Calitri ve-lo-emos por extenso mais tarde.

Poucas notícias chegaram até nós sobre os seus trabalhos entre as religiosas de Atella. Lá os padres Fiocchi e Margotta tentaram restabelecer a vida comum e consolidá-la pelo retiro espiritual. Por meio deles o santo entrou em relação com esse convento, o que satisfez imensamente ao bispo de Melfi, que instou com o santo a que incentivasse a obra começada. Desde então Geraldo não regateou conferências e cartas permanecendo sempre em ativa comunicação com o convento. E as religiosas puderam colocá-lo no número dos seus maiores benfeitores: não só admoestava santamente as irmãs, mas procurava aumentar-lhes o número persuadindo e movendo filhas de famílias distintas a entrar no convento. Geraldo, após a sua morte foi lá venerado como protetor, e fez honra a esse título porquanto o processo de beatificação narra vários milagres operados pelo santo à invocação das religiosas de Atella.

Em dois conventos, sobretudo, tornou-se Geraldo o guia espiritual manifestando-se qual fonte de sabedoria, zelo e consolação: o mosteiro do SS. Redentor em Foggia e o das carmelitas em Ripacandida.
Em cada um desses claustros destacava-se naquele tempo, uma alma, que por sua santidade e extraordinários carismas, se relacionava em afinidade espiritual com Geraldo, reclamando, por isso, dele especiais conselhos e instrução: a sóror Celeste Crostarosa em Foggia, e a sóror Maria de Jesus em Ripacandida, ambas superioras e beneméritas quanto ao rigor da observância regular.

Maria Celeste Crostarosa, na qual se equilibravam os dons do céu com os sofrimentos da terra, vivia há mais de vinte anos no conservatório de Scala quando a 3 de outubro de 1731 teve um êxtase de importância capital na história de Santo Afonso e da fundação do Instituto do SS. Redentor. Nesse êxtase viu ela uma falange de homens apostólicos, que impelidos pelo zelo das almas, percorriam povoações e aldeias procurando prestar auxílio espiritual às almas abandonadas. À frente desses apóstolos estava Afonso de Ligório. Em seguida uma voz soou a seus ouvidos: “Escolhi a este para fundador de uma obra que há de promover a minha glória”. Entretanto não foi dado a Crostarosa realizar a sua vocação no mos-teiro de Scala. Após haver por vários anos dirigido um conservatório em Nocera comunicando-lhe vida nova, fundou em Foggia (1738) o conservatório do SS. Redentor, no qual a encontramos como superiora no tempo de Geraldo. A educação esmerada, que lá recebiam as filhas das melhores famílias sob a sua direção, foi uma bênção para Foggia e para toda a Apulia.

A Irmã Crostarosa formou-se um alto conceito de Geraldo à leitura de uma carta, na qual o santo escreveu entre outras coisas o seguinte: “Desejo amar a Deus, estar sempre unido a Deus e fazer tudo por Deus”. O espírito que transparecia dessas palavras, condizia inteiramente com o dela. Quando teve ocasião de se encontrar pessoalmente e conferenciar com Geraldo, descobriu a afinidade existente entre a sua alma e a do santo, e a utilidade que da aproximação com ele podia resultar para si e suas filhas.
Geraldo respondeu perfeitamente à piedosa confiança da superiora de Foggia. Visitava-a sempre que passava por Foggia e dispunha de alguns momentos livres.

Essas conferências recordam-nos vivamente as que tiveram outrora São João da Cruz e São Pedro de Alcântara com a excelsa Santa Teresa, pois que grande era a harmonia, elevação espiritual e caridade ardente com que essas duas almas se entrelaçavam na identidade dos pensamentos e sentimentos.

As conversações espirituais com Irmã Crostarosa tornavam sempre caro para o nosso santo o mosteiro de Foggia. Duplamente bem vindos eram-lhe os pedidos do bispo diocesano no sentido de se dedicar, em maior escala, ao conservatório e às suas religiosas. Por meio de cartas, pequenas conferências e palestras individuais procurava nutrir-lhes nos corações o fogo do amor divino e animá-las, como boas esposas de Cristo, é consecução de lídimas virtudes, à generosidade, à observância da Regra e ao amor do celeste Esposo. Os seus esforços foram coroados dos mais brilhantes resultados, como o demonstram os depoimentos feitos mais tarde pelas irmãs.

“As alocuções de Geraldo, atesta uma delas, tinham geralmente por objeto, os sublimes atributos divinos, a SS. Virgem e os santos. Sempre que falava ou pensava em Deus, perdia os sentidos e arrebatava-se em profundo êxtase”. “O seu coração, escreve uma outra das suas ouvintes, transformava-se em vulcão de amor divino; seu rosto inflamava-se como o de um anjo vindo do céu para falar aos homens”.

As religiosas de Foggia foram testemunhas de um dos mais notáveis êxtases do nosso santo. Foi na véspera da festa da SS. Trindade em 1753. Geraldo saíra de um colóquio com uma religiosa, a quem reanimara, enquanto as irmãs cantavam no coro as primeiras vésperas da grande festa. Na solidão do claustro ecoavam os sons festivos dos hinos e salmos. Geraldo comoveu-se; seu espírito acompanhando o canto abismou-se na contemplação do sublime mistério. Penetrando sempre mais nesses abismos incompreensíveis, imensos e suaves, a alma do servo de Deus desprendeu-se do mundo e inundou-se de um júbilo intenso. Com a velocidade da flecha pôs-se a correr pelos corredores do mosteiro repetindo em alta voz as palavras da liturgia: “O alti-tudo divitiarum sapientiae et scientiae Dei; quam in-comprehensibilia sunt judicia ejus et investigabiles viae ejus. — Ó inesgotável riqueza da sabedoria e ciência de Deus! quão imperscrutáveis são seus juízos e incompreensíveis os seus caminhos”.

Geraldo permaneceu nesse arroubo extático todo o tempo em que no coro se cantava o ofício divino. Ao saírem da oração as irmãs encontraram-no ainda nesse estado de júbilo celestial. Ao voltar a si, percebendo as religiosas que o cercavam exclamou: “Irmãs, amemos a Deus” e permaneceu imóvel; seus olhos fitavam o céu e faiscavam. De repente suspendeu-se nos ares em considerável altura. Terminado o êxtase, empalideceu exausto pela veemência, com que o amor divino dele se apoderara.

Outras manifestações dos carismas extraordinários de Geraldo completaram a impressão desse êxtase. A uma irmã conversa, que se achava enferma, Geraldo restituiu a saúde com o sinal da cruz, quando já haviam perdido toda a esperança de sua cura. Da mesma forma livrou a uma jovem de uma febre, que zombava de todos os remédios.

Também o seu dom de profecia teve lá sua manifestação. Palestrava, um dia, com sóror Crostarosa e outras irmãs sobre assuntos de piedade quando, a queima-roupa, interrogou a uma irmã, se ela se confessava freqüentemente. Como a resposta fosse afirmativa, pediu-lhe o santo, que se unisse intimamente a Deus “porque — acrescentou — o dia da vossa morte não está longe”. A religiosa, ainda jovem e robusta, bem como as demais religiosas admiraram-se dessas palavras, tomando-as por um gracejo. Geraldo, a quem nada passava despercebido, renovou sua admoestação afirmando ter falado com toda a seriedade. “Mesma a mais sólida saúde, disse, desaparece em um momento; por isso; irmã procurai sempre união com Deus; dentro de oito dias tereis de comparecer em sua presença”. A irmã tomando a sério a palavra do santo, preparou-se para a morte; e não fez em vão, porque poucos dias depois teve uma morte santa.

Uma aluna do colégio por nome Gertrudes de Cecília, gostava de acompanhar as irmãs para ouvir, no locutório, as palestras do santo. Uma vez, terminado o piedoso colóquio pediu-lhe Geraldo que entoasse um hino qualquer. Acanhada não quis, a princípio, mas por fim, acedendo ao desejo do santo, cantou a estrofe de Metastasio Se Dio veder tu vuoi. (cfr. pág. ...???). As palavras dessa bela estrofe penetraram como setas o coração do santo. A menina não havia ainda terminado os seus quatro versos, e Geraldo arrebatou-se e quedou imóvel como um serafim de olhos faiscantes; terminado o hino o santo ainda permaneceu em êxtase por longo tempo.

Desde então Geraldo interessou-se pela menina e não tardou a encontrar ocasião de lhe patentear sua afeição por um importante ato de caridade. Um dia foi Gertrudes confessar-se, mas ou por não haver feito bem o exame de consciência, ou por leviandade infantil, não se portou à altura da dignidade do sacramento. Dirigindo-se ela à mesa da comunhão, Geraldo foi ao seu encontro: “Menina, disse, julgas ir bem preparada para a comunhão, mas não te confessaste bem. Olha, omitiste tal pecado; volta já ao tribunal da penitência e faze uma confissão geral”. A pobre menina quase morreu de susto; não pôde proferir palavra; confundida foi-se preparar melhor e confessar-se com mais sinceridade. A antiga leviandade descambou logo no extremo oposto; Gertrudes tornou-se escrupulosa; profunda melancolia abateu-lhe o rosto outrora tão jovial sem que ninguém pudesse adivinhar a causa dessa transformação. Geraldo foi novamente em seu auxílio. Ao chegar em Foggia apressou-se a ir ao mosteiro para consolar a menina. “Minha filha, disse, a tua confissão foi bem feita; Deus está contente contigo”. Essas palavras dissiparam todos os pensamentos tristes e Gertrudes sentiu-se novamente feliz e completamente tranqüila.

Geraldo conhecia a menina melhor do que ela suspeitava. Embora piedosa e educada no mosteiro a pequena não sentia nenhuma vocação para a vida religiosa; desejava voltar para o seio da família e suspirava pela hora em que lhe seria dado abandonar o colégio. Geraldo que bem conhecia os desejos e aspirações da menina, aconselhou-a muitas vezes a não pensar no mundo; escolhida para esposa de Cristo, devia ficar onde estava porquanto o seu lugar era o convento e não o mundo. Gertrudes porém não estava pelos autos; embora muito acatasse o santo, não gostava nada de suas admoestações. Também aqui deixou Geraldo entrever à pequena, que suas palavras eram inspiradas por Deus. “Se abandonares o convento, disse com seriedade, terás de arrepender-te muito; o mundo armar-te-á os maiores perigos, e por fim, querendo ou não terás que voltar”. A menina atemorizou-se com essas ameaças e ficou no mosteiro; tomou o hábito e tornou-se boa religiosa. Após a profissão contraiu uma moléstia, que na opinião dos médicos, só podia ser debeladas com os saudáveis ares da sua terra natal. Os ares de São Severo contribuíram para o restabelecimento da saúde do corpo, mas foram prejudiciais para a vida espiritual de Gertrudes. Pouco consolidada na vida interior, a jovem, rodeada das vaidades mundanas, foi vítima das mais tremendas tentações. Fascinada por sugestões de amigos, esqueceu sua santa vocação e resolveu não regressar mais ao mosteiro. Nesse íinterim lembrou-se da profecia e terríveis ameaças de Geraldo; arrependeu-se amargamente do passo que dera e desfeita em lágrimas voltou para o convento, onde se consagrou, com novo ardor ao serviço de Deus. Durante sua longa vida — faleceu em 1830 — não cessou de enaltecer a santidade de Geraldo, cujos milagres presenciara e a cuja influência ficou devendo a sua vocação e salvação do naufrágio.

Maiores serviços do que ao conservatório de Foggia teve o santo ocasião de prestar às carmelitas de Ripacandida. Essas religiosas de Santa Teresa estavam em íntima união com a Congregação redentorista. Em 1750 pregara-lhes Santo Afonso, em pessoa, os santos exercícios, colhendo deles a melhor impressão: “Nunca imaginara, diz ele, encontrar em um rochedo tão belas flores”. Em vez de incentivar teve ele de restringir as austeridades, principalmente os excessivos jejuns das religiosas.

Além do santo fundador, diversos outros redentoristas trabalharam no cultivo espiritual do mosteiro, mormente o Pe. Margotta que mereceu do bispo de Melfi o honroso nome de “Anjo da Guarda de Ripacandida”. Também o Pe. Fiocchi lá esteve freqüentemente como conselheiro e dirigiu durante vinte anos, duas religiosas desse mosteiro.

O Irmão Geraldo não tardou a ser lá conhecido. Já no segundo ano da sua vida religiosa entrou em contato com o mosteiro; uma das suas cartas à Irmã Maria de Jesus tem a data de 17 de dezembro de 1751. Naquele tempo a Irmã Maria era a priora do convento. Conseguira fazer florescer e Ripacandida o espírito de Santa Teresa e suas primeira filhas, e muito se alegrou em encontrar em Geraldo o incentivador das suas aspirações e esforços. Também ela, como soror Celeste Crostarosa, percebeu logo em Geraldo, o grande e incomparável homem de Deus; a primeira troca de idéias foi o suficiente para convencê-la do espírito superior que o animava e enchê-la de veneração e confiança. Do seu lado o irmão sentiu logo a afinidade das suas aspirações como as da priora de Ripacandida. Assim em pouco tempo estabeleceu-se entre as duas almas uma dessas nobres uniões espirituais que encontramos na vida dos santos e que têm por fim o auxílio mútuo de orações e incentivo para o amor de Deus e do próximo.

Sempre que as circunstâncias o permitiam o santo ia a Ripacandida visitar a priora das carmelitas e entreter-se com ela a respeito dos santos desejos e aspirações de ambos. “Lá, diz Tannoia, podia-se contemplar dois espelhos côncavos que se projetavam em todo o esplendor mutuamente os raios da luz divina que neles caíam. Essa veneração e confiança da superiora comunicaram-se logo a todas as religiosas, que ficaram desejosas de recorrer a ele nas necessidades do seu coração. Mons. Basta, grande venerador do santo irmão, aprovava inteiramente esse estado de coisas. Geraldo do seu lado também interessava-se muitíssimo por essas filhas de Santa Teresa, as auxiliava na medida das suas forças, inflamava, fortalecia, consolava. Quase cada semana escrevia-lhes para esse fim uma ou mais cartas, das quais afirma o Pe. Cafaro que ninguém as pode ler sem se admirar devido à circunstância de Geraldo ter sido um simples irmão leigo mal sabendo ler e escrever.

Nada escapava à perspicácia desse diretor extraordinário, coisa alguma parecia insignificante à sua caridade contanto que se relacionasse com o bem temporal e espiritual do convento.
O seu desejo ardente era de transformar todas em verdadeiras esposas de Cristo. “Ó meu divino amor, exclama em uma carta a Maria de Jesus, permanecei sempre no coração desta vossa amada esposa!... oh! quanto desejo moreis todas no lado aberto de Jesus e no coração da Mãe das Dores! É lá que se encontra toda a doçura e paz”.

“Minha irmã, escreve à sóror Maria Batista da SS. Trindade, conformemo-nos com a vontade divina... O verdadeiro amor divino consiste na entrega total a Deus e na conformidade da nossa vontade com a sua. Cuidado para não cometermos a falta voluntária, que desagrada imensamente a Deus”.

Não se limitando a simples admoestações promete-lhe o auxílio das suas orações.
“Crede-me, prezada irmã em Jesus Cristo, escreve à superiora Maria de Jesus, não cesso de pedir instantemente ao Senhor, faça-vos e as vossas irmãs suas verdadeiras esposas e executoras de sua santíssima vontade. Posso dizer com verdade, que me não esqueço de vós nas visitas que faço ao Senhor; encontro-vos em seu sacratíssimo lado e ofereço a Deus por vós e vossas filhas o coração divino tras-passado pela lança”.

Considerava como suas próprias as dificuldades e aflições das religiosas. “Deus sabe, externou-se uma vez, a dor que sinto vendo-vos em perturbação: mas, acrescentou, o que eu propriamente sinto não é dor mas inveja. Bendito seja o Senhor, que vos conserva no caminho da santificação”.

Uma das principais preocupações de Geraldo era facilitar às donzelas a entrada no convento. Esmolava para completar o dote das aspirantes pobres e dirigia-se, para esse fim, também a outras pessoas mormente aos confrades influentes.
Julgava-se obrigado a tomar em consideração muitas vezes coisas insignificantes , pequenos desejos das irmãs. Em uma carta escrita de Nápoles a uma irmã de Ripacandida lemos o seguinte tópico:

“Prezada irmã, lembrei-me que desejais um livrinho de cânticos; no ano passado falastes-me disso; mas como não reclamastes, não vô-lo mandei, esperando para isso ocasião azada. Agora em Nápoles lembrei-me e envio-vos o livro desejado. Cantai os hinos em vossa cela, para que vos torneis uma grande santa, e rezai sempre por mim. Os vossos irmãos enviam-vos saudações; eles vão bem”.

Como pagamento dessa caridade e atenção exigia apenas oração contínua e fervorosa. “A bondade e o favor que me tendes feito, escreve à Irmã Maria de Jesus, encheu-me de grande consolação, mas causam-me também humilhação e tristeza; porquanto comparando-me a essas verdadeiras esposas de Cristo, reconheço minha indignidade. Sinto-me forçado a acusar-me como réu, a implorar misericórdia em toda parte e a pedir humildemente perdão em nome de Jesus Cristo. Para eu me corrigir necessito das vossas orações e das vossas filhas; espero que essas orações coletivas me façam cumprir bem a vontade do meu Deus e nosso Pai comum”.

Grande contentamento sentia o nosso santo quando as religiosas oravam por ele ou lhe ofereciam santas comunhões.
“A notícia das comunhões recebidas por minha intenção, escreve ele, causou-me indizível prazer, mas também me envergonhou e confundiu; lembrei-me da bondade excessiva de Deus, que fez suas caras esposas cuidar de quem tanto o tem ofendido! Ó excesso de amor! Ó milagre assombroso! Ó caridade do bom pastor, que com tanto desvelo corre atrás da ovelha desgarrada! Somente posso dizer: O amor que me prodigalizam, vem do Salvador, é o fruto do sangue de Cristo e das dores de Maria”.

Em uma outra carta à Irmã Batista da SS. Trindade escreve o seguinte: “Minha irmã, recomendai-me a Deus agora mais do que nunca, porque me sinto em grandes necessidades espirituais; não vos posso esquecer, porque o vosso sobrenome da SS. Trindade, faz-me sempre recordar de Deus e põe-me em sua presença. Só Deus sabe o quanto vos prezo, minha irmã, por serdes tão fiel esposa de Jesus Cristo. Amai a Deus de todo o vosso coração; tornai-vos santa, e então pouco importa que padeçais. Eia, sofrei por amor de Deus, e os tormentos deste mundo ser-vos-ão um verdadeiro paraíso”.

Mencionemos ainda uma outra súplica de Geraldo, nesse sentido, à irmã Teresa do divino Amor: “Prezada irmã em Jesus Cristo. Lembro-me de vós crendo que vos lembrais também de mim e suplicais a Deus por minha intenção. Digo-vos com sinceridade: podeis auxiliar-me; chamam-vos do divino Amor e tenho por certo que já vos transfundistes no Amor da essência infinita de Deus e em sua santíssima vontade. Tornai-vos santa e logo!”

No post-scriptum de uma carta à irmã Maria de Jesus lembra-se o santo da sua morte e implora das irmãs pia recordação de sua alma. A irmã Oliveira acabava de morrer, e Geraldo, prendendo-se a essa circunstância, escreve: “Embora eu nada valha, ofereci, oito dias, a santa comunhão pelo descanso de sua alma, e pretendo fazer o mesmo para todas que morrerem, afim de que cheguem logo à visão de Deus. Dizei isto a todas para que se lembrem de mim também quando eu entrar na eternidade”.

A caridade, a que o servo de Deus julgava ter direito, reclamava-a também freqüentemente para os amigos. Em uma carta à Irmã Maria de Jesus recomenda uma alma que conquistara para Deus. Contentíssimo com o resultado dos esforços em prol dessa criatura escreve: “Nosso caro Luiz já não tem descanso; tornou-se louco de amor por Jesus Cristo. Abismou-se em Deus e não se quer separar de Jesus. O mundo não tem valor para ele, e as criaturas ele só as considera em Deus. Ama-o, querendo transformar-se nele. Mais não vos posso dizer”.

A essa mesma religiosa recomenda uma irmã enferma do conservatório de Foggia, cuja morte ele muito sentiria. Ele escreve: “Quero que supliqueis instantemente ao Senhor por uma irmã que está à morte. Ah! não quero que ela morra, dizei isto a N. Senhor. Desejo que ela se santifique ainda mais, e que morra idosa depois de passados muitos anos no serviço de Deus. Conjurai por ela a Onipotência, para que desta vez se realize o nosso desejo. Mando-vos em nome de Deus que a não deixeis morrer; vou começar uma novena à divina Onipotência pedindo a saúde dessa Irmã”. A oração foi atendida, porque a religiosa recuperou a saúde.  

A veneração do santo conquistava sempre mais terreno no mosteiro de Ripacandida. O seu aparecimento era para as religiosas como o de um anjo, e completava a impressão produzida por suas cartas. Sua aparência mortificada, seu semelhante, cheio de paz e recolhimento, sua devoção nas orações, sua modéstia e humildade tudo edificava, excitava à virtude e sugeria confiança e veneração.

Também aqui mostrou-se Geraldo taumaturgo e homem de extraordinários carismas. Duas vezes pelo menos glorificou Deus o seu servo, no locutório, com arroubos extáticos.
Um dia entretinha-se Geraldo com a superiora junto à grade, quando foi tomado de uma alegria toda celeste e de emoções fortes, temendo não poder resistir às doçuras celestiais, para não voar pelos ares agarrou-se à grade; mas tão intensa foi a veemência das emoções que as barras de ferro cederam curvando-se como cera em suas mãos; ao mesmo tempo os pregos da grade se desligaram. A superiora gritou, chamando a atenção do extático para o prejuízo que ia causar. Os gritos da religiosa despertaram-no como de um profundo sono. Vendo o que acontecera, ficou embaraçado e pediu a superiora mandas-se consertar quanto antes a grade. A irmã realizou os desejos de Geraldo, mas deixou algumas barras curvadas para recordação do fato maravilhoso. Ainda em 1853, quando em Ripacandida se faziam os exames para o processo de beatificação, estavam essas barras no locutório do convento.
Uma outra vez reunira Geraldo as religiosas diante dessa mesma grade para uma pequena conferência, que iniciou com as palavras do Cântico dos Cânticos: “O Rei introduziu-me em sua adega”. Discorrendo, a seguir, sobre a pessoa de Jesus Cristo, não tardou a sentir em si mesmo a força do vinho do divino amor, caiu em êxtase diante das irmãs, iluminando o locutório de tanta luz que este parecia arder em chamas.

O seu olhar profético comprovou-se também no mosteiro das carmelitas. Ouvindo que lá uma religiosa adoecera, inspirando a doença sérios cuidados, recolheu-se por uns momentos e garantiu que a irmã não morreria daquele enfermidade. Replicaram-lhe que a religiosa já se achava nas últimas. “Não importa, acrescentou Geraldo, vereis que a minha afirmação é verdadeira; a doente precisa ainda de vida, para fazer maiores progressos na perfeição”. Realizou-se a profecia; a religiosa sarou, levando depois, vida ainda mais fervorosa.

A pureza de intenção que guiara o santo em seus trabalhos no mosteiro de Ripacandida, manifestou-se à evidência, quando Mons. Basta proibiu às religiosas qualquer correspondência epistolar a não ser com o confessor; proibição essa que atingia também o nosso santo. É claro que isso doeu às piedosas irmãs, produzindo queixas, murmurações e grande tristeza. Geraldo soube do ocorrido por meio de um sacerdote, a quem a superiora comunicara o fato.

Imediatamente escreveu à superiora:
Reverenda Madre.
Muito bem procedeu o sr. bispo, proibindo-vos escrever cartas; é a vontade de Deus, que quer afastar de vós grandes empecilhos; é um sinal de que vos ama e vos quer unir estreitamente a si. Ficai tranqüila e cheia de coragem! Essas coisas, longe de vos desgostarem, devem encher-vos de santa alegria. Tudo deve ceder, quando se trata da vontade divina. Vós sabeis isso melhor do que eu e muitos outros. Que quereis que vos diga? Já vo-lo e disse e torno a dizer com confiança, embora vós me possais dar instruções a esse respeito. Não compreendo como uma alma consagrada a Deus possa sentir pesar sobre a terra e não se alegrar com a realização da vontade divina em tudo. O beneplácito divino é o único apoio da nossa alma. Maldito seja o amor próprio que nos rouba o maior tesouro, o paraíso na terra, o próprio Deus. Quão miseranda é a insensatez humana que nos faz perder tamanho lucro. Que de melhor poderemos fazer para agradar a Deus, do que executar com perfeição sempre e em tudo sua santíssima vontade, obedecendo até a seus menores acenos? Sejamos perfeitamente indiferentes a respeito de tudo para podermos cumprir a vontade divina com aquela pureza de intenção, que Deus de nós exige. Que bem imenso é a vontade divina! Que tesouro oculto e incompreensível! Ó vontade divina, vales tanto quanto o próprio Deus; quem, senão Deus, te poderá com-preender!  
Asseguro-vos, reverenda madre, meu grande contentamento por saber que sois uma daquelas almas que procuram seu único alimento na amabilíssima vontade de Deus. Bem conheço o vosso heroísmo nesse ponto! Continuai a unir-vos mais perfeitamente à vontade divina; é isso que fazem os anjos no céu, e o que também nós devemos fazer. A vontade divina reine no céu e na terra; seja ela o paraíso no céu e o nosso paraíso na terra.

Comunicai estas linhas às irmãs. Penso que a proibição do bispo se estende também a elas. O prelado procedeu bem; peço que nenhuma se perturbe por isso, o que seria queixar-se de Deus. Fiat voluntas Dei. Estou inteiramente de acordo, que me não escrevais mais. Se nas lembranças que me enviais houver qualquer sombra de desobediência, peço que desistais também disso. Basta que me recomendeis a Deus.

Essa é a minha vontade. Conheço as ótimas intenções do santo prelado que deseja a união íntima de todas com Jesus Cristo. Indo a Ripacandida, não pedirei licença para me entreter convosco; não é preciso que nos vejamos no mundo, porquanto ver-nos-emos no paraíso. Sobre a terra devemos santificar-nos fazendo a vontade dos outros e não a nossa, porque aquela é para nós a vontade de Deus”.

Essa epístola, ditada pelo verdadeiro espírito religioso, teve em Ripacandida o efeito do bálsamo sobre a chaga; fez calar as tempestades da alma; todas declararam-se prontas para o sacrifício.

Deus, porém, como sempre, contentou-se aqui com a boa vontade, exigindo apenas incondicional submissão. O bispo, tendo provado a obediência das religiosas, retirou a proibição quando ao santo, declarando ser sua vontade que as irmãs sempre procurassem conselho e conforto nesse excelente religioso, que era perfeito conhecedor do espírito que reinava no mosteiro. Que o bispo não queria absolutamente atingir o irmão com aquela proibição, e que não se desgostara com ele, prova-o o fato de ele achar bom consultar não só ao Pe. Fiocchi, mas também à Geraldo quando se tratou do exame da vida extraordinária e do espírito da Madre Maria de Jesus.

Essas santas relações do santo com a comunidade de Ripacandida, que se formaram em conseqüência da sua estreita união com a superiora Maria de Jesus, não se turbaram quando esta, em maio de 1753, foi substituída pela nova superiora Maria Michaela de São Francisco. Ao receber da demissionária a comunicação da eleição da nova priora, o santo mandou participar-lhe o seu contentamento, pedindo-lhe se tornasse uma santa e prometendo escrever-lhe em breve “porque essa é a vontade de Deus”.

Uma semanas depois a nova superiora recebeu a primeira carta de Geraldo, que tornou a expressar a sua satisfação pela eleição dela. Depois acrescentou: “Peço a Deus, queira amparar-vos, para desempenhardes bem o vosso cargo e velardes cuidadosamente sobre as numerosas esposas de Cristo. Espero que o Senhor vos conceda o espírito que animou aquele Serafim de amor, Santa Maria Madalena de Pazzis, grande serva de Deus e da SS. Virgem, para que vós e vossas filhas se tornem outros tantos serafins do amor divino”. Com esse desejo pediu se lembrassem dele em suas orações. Em atenção à antiga superiora, a benemérita irmã Maria de Jesus, Geraldo acrescentou ao terminar: “Peço-vos recomendar-me à Irmã Maria de Jesus; ela foi vossa mãe desde o princípio e alimentou-vos com o leite do amor divino”.

Embora essa recomendação não fosse necessária, o santo quis dá-la como um aviso, não desprezível, à nova superiora e em cumprimento da promessa feita, poucos dias antes, à antiga priora. Esta em sua santa humildade, que a não deixava ver nada de bom em si mesma, deu a entender ao santo irmão, que, deixando de ser superiora, todos, inclusivamente Geraldo, se esqueceriam dela: de passagem externou ainda o desejo de uma visita sua. Geraldo respondeu: “Pedis que vos visite; sim, reverenda madre, irei, de todo coração, para vos consolar, se essa for a vontade de Deus. Tende ânimo e não vos perturbeis, se me não quiserdes desgostar. Dizeis que, não sendo já superiora, os outros vos esquecerão. Meu Deus, como podeis dizer isso? E mesmo que as criaturas vos esquecessem, o vosso esposo celeste não vos esquecerá. Quanto a mim, não vos tenho olvidado e desejo que vos lembreis sempre de mim. Eia, mostrai-vos generosa no amor divino; tornai-vos uma santa; livre agora das preocupações de outrora, tendes mais tempo para isso. Rogai por mim, que necessito de amparo espiritual e me acho — Deus sabe — em muitas tribulações e tristezas. Se quiserdes podeis ajudar-me; fazei-me esse ato de caridade”.

As relações de Geraldo com o mosteiro de Ripacandida permaneceram, pois, invariáveis sob a direção da nova superiora; o servo de Deus continuou até o fim da vida como diretor espiritual e conselheiro extraordinário do convento. Da excelência dessa direção o leitor se convencerá meditando no buquê que comporemos no capítulo seguinte com as recomendações dadas pelo santo em diversas de suas cartas.  

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