Trocando de roupa para o Banquete Nupcial

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Caminhada para o Céu

segunda-feira, 15 de abril de 2013

“Cada palavra de seus lábios penetrou, como uma seta, os corações inflamando-os de amor a Jesus e a Maria”.

A VIDA PRODIGIOSA DE SÃO GERALDO MAGELA





 CAPÍTULO XXII 

Ainda alguns trabalhos apostólicos 

Muito a contra gosto o Pe. Margotta deixara partir de Nápoles o nosso santo, e por isso aguardava a primeira oportunidade para reavê-lo perto de si. Esta parecia ter chegado três meses depois, quando se podia prudentemente supor extinta a sensação causada por Geraldo em Nápoles e afastados os incômodos por ela produzidos.

Santo Afonso, que só por esse motivo afastara o santo de Nápoles, concordou com o desejo do Pe. Margotta, e deu ordem a Geral-do de se dirigir novamente à capital pelos fins de fevereiro de 1755. O Pe. Margotta foi pessoalmente buscar o irmão em Caposele e levou-o primeiro a Calitri, sua terra natal, onde tinha negócios a tratar.

Geraldo, sendo pouco conhecido em Calitri, podia lá esperar sossego e lazer para os seus exercícios de piedade e boas obras. E de fato, nos primeiros dias, tudo correu de acordo com os seus desejos. Enquanto Margotta punha em ordem os seus negócios, ele permanecia em oração diante do tabernáculo. Admiravam-lhe o recolhimento e a devoção, mas como nada supunham nele de extraordinário, não o molestaram.
Um dia porém chegou uma senhora de Bisaccia, onde o santo era conhecido. Tendo ouvido falar da chegada de Geraldo a Calitri, essa senhora, que lá tinha um parente gravemente enfermo, quis valer-se do poder taumaturgo do santo em favor dele. Os dois redentoristas hospedaram-se na casa do arcipreste Berilli. Lá foi ela perguntar pelo santo; ao ouvir que não estava em casa, esperou a sua volta.

Geraldo não tardou; a mulher caiu-lhe aos pés e conjurou-o a restituir a saúde ao enfermo. O santo ouviu-a, consolou-a e despachou-a garantindo-lhe que seu parente recuperaria a saúde.
O pessoal da casa estranhou a novidade; o pedido confiante da mulher e o procedimento do irmão eram-lhe inexplicáveis; falaram disso ao Pe. Margotta com ar de zombaria e pouco caso. “Vós vos rides, disse Margotta, porque não conheceis os carismas desse irmão”, e contou-lhes diversos episódios das virtudes e milagres da vida de Geraldo.

Essa notícia alastrou-se como fogo em Calitri, pondo fim ao descanso do santo; começaram as visitas dos pobres, aflitos e curiosos. Vendo em tudo isso o dedo de Deus, não hesitou Geraldo em fazer em Calitri o que fazia em outras cidades, exercendo da manhã até à noite todas as obras de misericórdia corporal e espiritual.

João Cioglia, excelente e estimado cirurgião, foi o primeiro a experimentar a caridade e a força taumaturga de Geraldo. Havendo ele enfermado gravemente e tendo sido desenganado pelos médicos, os parentes recorreram a Geraldo; o Pe. Margotta deu-lhe ordem de não se opor ao pedido. O santo visitou o cirurgião, fez-lhe sobre a fronte o sinal da cruz e no  mesmo instante Cioglia sentiu-se bom. As pessoas presentes assombraram-se com o milagre, mas Geraldo disse com simplicidade: “Estais vendo o que pode a obediência”.

Da mesma forma curou um outro homem, a quem Margotta o enviou expressamente, enternecido pelas lágrimas dos parentes. O resultado dessa visita de Geraldo, porém, não foi somente a cura instantânea do enfermo, mas também a resolução de fazer ele uma boa confissão e reconciliar-se com Deus.

Arcanda Rinaldi achava-se de visita na casa Berilli, onde se hospedou Geraldo, quando foi atacada de violenta enxaqueca. Vendo o chapéu do irmão em um canto do quarto, pensou: “Quero ver se esse homem é santo”; e pôs o chapéu na cabeça; as dores desapareceram como por encanto.

Devido a esse fato a família Berilli fez questão de obter algum objeto do uso do santo. Notando que os sapatos do irmão estavam já muito usados, mandaram fazer-lhe um par novo e guardaram o velho. E esses sapatos foram de grande utilidade como pre-ciosa relíquia. Um rapaz da casa atormentado por indizíveis dores intestinais sarou instantaneamente ao contato dos sapatos de Geraldo. Quando muito tempo depois voltaram as dores, o enfermo gritou: “Trazei-me depressa os sapatos de Geraldo” e também desta vez operou-se o milagre. Esses sapatos adquiriram em Calitri verdadeira celebridade, eram tidos na conta de remédio universal passando de do-ente a doente e operando, ao seu contato, curas maravilhosas. Também em Calitri Geraldo trabalhou com sucesso na salvação de muitas almas.

Uma piedosa senhora, Maria Cândida Strace, ao ouvir da santidade de Geraldo, quis ter com ele um colóquio sobre coisas espirituais; tinha enorme peso sobre o coração e não se atrevia a comunicá-lo a ninguém. Ao aproximar-se do servo de Deus perdeu a coragem e calou-se. O santo interrompeu-a com as palavras: “Como não quereis falar, eu falarei por vós”; disse-lhe tudo quanto lhe oprimia o coração e deu-lhe os necessários conselhos. Mais tarde a senhora declarou ter-lhe Geraldo manifestado coisas, que só Deus podia saber.

Mentor solícito — infelizmente sem resultado — foi o santo para um homem distinto, Nicolau Xavier Berilli, que desperdiçava o tempo nos prazeres terrenos: bons amigos, que se interessavam por sua alma, chamaram para ele a atenção de Geraldo, que lhe fez uma visita. Esforçou-se para incutir ao rico pensamentos sérios, mormente o de fazer em Caposele o santo retiro. Berilli ouviu atentamente a Geraldo, mas objetou a impossibilidade de fazer o retiro.

Apertado pelos argumentos do santo, disse enfim: “Lá irei em outubro”. — Ah, disse tristemente o irmão, quereis lá ir em outubro? não quereis mais esse mês”. E assim foi; o homem, então em perfeita saúde, foi atacado, em agosto, de violenta febre que em poucos dias o levou ao túmulo.
É escusado dizer que o convento das beneditinas de Calitri não lhe passou despercebido. O desejo que as irmãs tinham de conhecê-lo, deu motivo para uma visita, que aliás lhe foi imposta pelo Pe. Margotta. O exterior do santo causou nas monjas tanta impressão, que tiveram desejo de lhe falar com toda franqueza; sua santidade e sabedoria emprestaram tal unção às suas admoestações, repreensões e conselhos, que até os mais fracos e teimosos espíritos os receberam de boa vontade. As religiosas disseram a uma voz: “Cada palavra de seus lábios penetrou, como uma seta, os corações inflamando-os de amor a Jesus e a Maria”.

Uma noviça, aborrecida da vida solitária, andava com ideia de voltar ao mundo. Geraldo mandou chamá-la e disse-lhe algumas palavras sobre a excelência da vida religiosa, porém com tanto fogo e energia, que a moça dali saiu transformada, com a resolução firme de se tornar uma santa religiosa.
Uma outra monja, atormentada de escrúpulos, inconsolável até então, recuperou a paz depois de um colóquio com Geraldo.

Para despertar novo fervor na comunidade Geraldo, em suas palestras com as monjas, entremeava sempre avisos sobre a observância regular e recomendava-lhes com insistência a digna recepção dos sacramentos. As monjas não foram surdas às suas admoestações; só num ponto quiseram resistir-lhe. O locutório era muito mal colocado; a grade dava para o adro da igreja, o que, além de outros inconvenientes, podia facilmente ocasionar falta de respeito devido ao lugar sagrado. O santo, desaprovando aquilo, chamou a atenção da abadessa intimando-a a tomar as necessárias providências.

A abadessa observou que não podia fazer aquilo por autoridade própria necessitando da aprovação das suas subalternas. As religiosas, em suas confabulações, não chegaram a resultado nenhum. A teimosia das religiosas desagra-dou muito a Geraldo, que se queixou ao Pe. Margotta dizendo não poder compreender como uma bagatela, cujo sacrifício era tão agradável ao Senhor, podia causar tanta dificuldade.

Margotta aconselhou-o a dirigir às irmãs algumas palavras sérias a esse respeito, em uma visita após o meio-dia. Geraldo seguiu o conselho e o resultado foi que as monjas se declararam prontas a fazer cessar aquele inconveniente. Geraldo quis começar imediatamente a mudança do locutório, mas a hora já não o permitiu; ficou para o dia seguinte. Entretanto mudou-se a opinião das volúveis irmãs; no recreio da noite falou-se no assunto e surgiram tantas dificuldades, que se abandonou a resolução tomada, deixando para outra ocasião a sua realização. Geraldo viu em espírito a volubilidade das monjas e encheu-se de tristeza.

Interrogado por Margotta respondeu: “Estou inquieto por causa das religiosas”. Na manhã seguinte foi ao mosteiro, mandou chamar a abadessa e perguntou-lhe se estava em pé a resolução tomada. A abadessa respondeu com expressões vagas, traindo grande embaraço; afirmou que se não tinha objetado nada de positivo em contrário. Geraldo interrompeu-a: “Como, não se objetou nada contra? e uma irmã falou isto, outra aquilo contra, e enquanto uma apresentava um motivo a outra já se excogitava um novo. Pois bem. Não falemos mais nisso. Não quisestes ontem a mudança, nunca mais a efetuareis” e retirou-se.

Sua última palavra foi uma profecia. Mais tarde foi impossível mudar a grade por mais que nisso se pensava. Só depois da morte de todas as irmãs que não quiseram obedecer a Geraldo, é que o defeito se corrigiu.
Entretanto terminara Margotta os negócios que exigiam a sua presença na terra natal. Em fins de fevereiro (1755) ou princípios de março foi com o santo a Nápoles, onde se reproduziram os milagres e obras de caridade da primeira estada de Geraldo na capital.

Para não se repetirem as dificuldades de outrora, Geraldo procurou desviar-se das ruas mais movimentadas, tomando seu caminho pelos becos mais afastados e sossegados. Se isto tinha alguma vantagem, não deixava também de ter os seus inconvenientes.

Em um desses becos, já na primeira estada de Geraldo em Nápoles, duas prostitutas atreveram-se a perturbá-lo com zombarias e gargalhadas. Geraldo suportou tudo com paciência; mas nem a paciência do santo nem o tempo da sua ausência corrigiram o atrevimento das meretrizes. Desta vez esperaram-no à entrada da viela e fecharam-lhe o caminho postando-se diante dele. Uma empunhava um pandeiro e a outra uma guitarra. Puseram-se a dançar indecorosamente, acompanhando a dança com gestos inconvenientes. Diante disso Geraldo encheu-se de santa cólera; parou e disse em tom sério: “Não quereis acabar com isso? quereis então ver os rigores dos castigos divinos?”

Mal Geraldo pronunciara a ameaça, uma das meretrizes, como que tocada do raio, caiu por terra exclamando: “Madona, eu morro”. Sem movimentos foi ela transportada para casa por uns homens que acorreram ao ouvir o grito.
A cólera de Geraldo, sentiu-a também um vagabundo, que, contando com a compaixão do público, fingia-se de aleijado para receber esmolas; apresentava-se todos os dias com um pé embrulhado em farrapos, caminhando em muletas. Os transeuntes davam-lhe ricas esmolas. Geraldo já de há muito se afligia com aquilo porquanto detestava sumamente a hipocrisia. Aconselhou-o repetidas vezes a deixar o vício, e a trabalhar para ganhar decentemente a vida.

O malandro pouco se incomodou com os avisos recebidos e continuou o seu negócio desavergonhadamente. Geraldo perdeu a paciência; encontrando-o novamente repreendeu-o e por fim arrancou-lhe as falsas ataduras do pé. “Velhaco, se não quiseres condenar-te, cessa de enganar o próximo”. O menti-roso atemorizou-se, largou as muletas e fugiu.

Geraldo tornou-se mais cauteloso em Nápoles nesta segunda vez, quanto a seus carismas sobrenaturais, que procurava ocultar aos olhos dos homens. Estava ele entretendo-se com um seu amigo de Caposele à porta da igreja do Espírito Santo, quando duas damas dele se aproximaram: “Irmão Geraldo, disse-lhe uma banhada em lágrimas, vinde curar minha pobre filhinha”.

Por mais que Geraldo quisesse esquivar-se, não teve coração para recusar o seu pedido. Para desviar de sua pessoa as atenções do público, quis aparecer à cabeceira da criança doente, como enviado de outrem. Eis porque disse: “Irei, mas primeiro pedirei permissão”. Desde então só procedeu dessa forma, atribuindo tudo à força da obediência; assim esperava afastar de si a admiração do público.

A afluência de visitantes não foi menor do que da primeira vez. Leigos de toda as condições, sacerdotes, homens de destaque e diretores de almas foram procurar os seus conselhos.
Possuímos uma carta de Geraldo dessa data, a qual nos mostra a consideração em que era tido como conselheiro, mesmo para seus confrades e sacerdotes venerandos da Congregação. O Pe. Francisco Garzilli, homem espiritual de setenta anos de idade, sentia-se torturado de escrúpulos; recorreu a Geraldo em busca de conselho e conforto. O santo respondeu-lhe literalmente o seguinte:
“A graça de Deus encha o coração de V. Revma. e a SS. Virgem Maria vos conserve. Meu caro padre. Alegro-me pelo modo com que a Majestade Divina vos trata, e espero inabalavelmente que Deus vos dará completa vitória. Não temais. Coragem, o Senhor está convosco e não vos abandonará. Tendes dúvidas a respeito das vossas confissões. Esse temor é uma mortificação que Deus vos impõe. Afirmais que tendes motivo para temer. É claro, porque do contrário não ficaríeis angustiado.

Deus procede assim com os seus amigos e prediletos: deixa-os pensar que tudo é conseqüência de sua negligência. Se pudésseis crer que tudo isso vem de Deus, não haveria já torturas nem sofrimentos, mas tudo vos seria um paraíso neste mundo. Porém, mesmo que cometamos alguma pequena falta, lembremo-nos que também os santos não foram anjos sobre a terra. Confiai e esperai em Deus, meu caro padre, e recomendai-me, eu vô-lo peço, a Jesus Cristo e a SS. Virgem, que nos abençoem a ambos”.

A amizade do Padre Pepe, conquistada por Geraldo em Nápoles da primeira vez, não se alterou nem diminuiu; Geraldo privava sempre com esse distinto sacerdote. Prova disso temos numa carta do santo datada de 8 de março de 1755, à Sóror Maria Celeste Crostarosa em Foggia, na qual ele declara ter-se dirigido, para o bem do convento, ao Padre Pepe e conseguido considerável número de indulgências a lucrar-se pelas irmãs em diversas festas do ano.

Como recompensa da sua caridade pede o favor indicado no fim da mesma com as palavras: “Guardai esta folha, para que dela se possam servir também as que vierem depois de vós. Lembro-vos a obrigação de orardes por mim e aplicardes as indulgências também por minha alma quando eu morrer. Peço também a todas as superioras que vos sucederem, recebam uma ou outra comunhão pelo descanso de minha alma; de modo especial peço à superiora, que presidir à comunidade por ocasião da minha morte, mandar todas as irmãs oferecer por mim, durante oito dias, todas as comunhões e indulgências que puderem lucrar nesses dias. Não me esquecerei de vos recomendar ao Senhor para que sejais santas. Amém”.

Estas palavras foram consideradas pelas irmãs como um testamento do santo; recordaram-se dele no convento após a sua morte e guardaram essa carta com todo o respeito; diversas vezes usaram dela como relíquia, colocando-a sobre os enfermos. Em 1840 a Irmã Rafaela Pitasse, que sofria dores de olhos, tomou a carta do santo irmão, passou-a pelos olhos e ficou instantaneamente curada.

Também a segunda estada de Geraldo em Nápoles não foi de longa duração. Após a festa de Pentecostes, que em 1755 caiu a 18 de maio, foi Geraldo chamado de Nápoles para Caposele, para acompanhar os padres na missão de Calitri, pregada muito provavelmente de 25 de maio a 8 de junho. De acordo com essa determinação o santo deixou a capital na semana de Pentecostes e foi a Calitri.
“Operou maravilhas nessa missão, diz Tannoia, dando diariamente provas de seu dom de profecia e intuição dos corações. Levou aos confessores inúmeros pecadores convertidos e predispostos para a absolvição.
Os missionários hospedaram-se na casa da família Berilli. O irmão ocupado, um dia, na cozinha esbarrou casualmente num grande vaso com óleo, que se quebrou, derramando o azeite pelo chão. A filha da casa deu um grito e não deixou de dizer ao irmão palavras pesadas. A mãe, ouvindo aquelas palavras, foi à cozinha e censurou a menina; notificada do ocorrido correu a buscar lã para chupar o óleo derramado.

Entretanto Geraldo tomou os pedaços do vaso quebrado, e, quando a mulher voltou, estava o vaso intacto e inteiro, mais cheio de azeite do que antes. Mãe e filha assombraram-se, e Geraldo retirou-se para agradecer a Deus o tê-lo tirado do embaraço. — Momentos depois, encontraram-no no quarto, de joelhos, imóvel com os olhos erguidos para o céu.
Esse fato foi atestado por diversas pessoas da cidade e pela menina que foi testemunha ocular, e que mais tarde tomou o véu no mosteiro de Calitri.

Após a missão, provavelmente a 9 de junho, Geraldo voltou a Caposele, não para descansar, mas para se dedicar a novos trabalhos para a glória de Deus e a salvação das almas.

Não tardou a encontrar ocasião para desenvolver o seu zelo.
A 19 de junho chegou a Caposele para uns dias de descanso o arcebispo de Conza José Nicolai, grande amigo da Congregação. Em sua companhia achava-se, como secretário, um leigo, natural de Roma, homem apreciado pelo arcebispo pela habilidade nos negócios e querido em toda a sociedade por sua jovialidade; em sua presença desfaziam-se as preocupações; seus gracejos espontâneos e seu constante bom humor comunicavam vida à palestra; suas maneiras gentis e fidalgas prendiam a todos. Em Caposele conquistou logo todos os corações; também Geraldo sentiu simpatia por ele e deu-se-lhe a conhecer quanto lh’o permitia a sua grande modéstia; procurou até entrar em intimidade com ele, ouvindo suas conversas, às vezes prolongadas, rindo-se com os seus gracejos e respondendo-os com bom humor.

A amizade de Geraldo, porém, tinha um escopo especial. Iluminado por Deus viu que aquele homem aparentemente tão contente, não estava nada bem porquanto a sua consciência se achava em péssimo estado. Tratava-o com deferências para assim ganhar-lhe a confiança, pois julgava condição essencial para a conversão uma reciprocidade na amizade. E assim foi.
Um dia em que o secretário se achava excepcionalmente jovial, abraçou-o cordialmente e apertou-lhe contra o coração. Essas manifestações de carinho tiveram força misteriosa; o pecador começou a inquietar-se e a sentir remorsos de consciência; dali em diante procurou mais freqüentemente a companhia do santo depositando nele especial confiança.
Geraldo resolveu dar o passo decisivo; levou o secretário à capela doméstica e lançou-se-lhe aos pés. Obstupefato o secretário fitou o santo, sem saber o que aquilo significava. Não tardou porém a sabê-lo: “Meu amigo, começou Geraldo com voz comovida, não posso compreender a vossa alegria, vivendo vós assim na inimizade de Deus. Podeis acaso negar que sois casado e que abandonaste vossa esposa em Roma? Como podeis dar-vos como solteiro?

Como vos atreveis a iludir uma infeliz mulher?” Geraldo descobriu-lhe então toda a sua má vida, designando-lhe exatamente o tempo em que abandonara a Deus.
O pecador estava como que aniquilado diante do irmão. Caiu de joelhos, confessou sua má vida e seus crimes e pediu ao irmão o auxiliasse a voltar ao caminho da virtude.
Geraldo animou o pecador contrito à confiança em Deus e aconselhou-o a pôr imediatamente em ordem a sua consciência e a entender-se para isso com o Padre Fiocchi que se achava então em Caposele. Pálido de susto foi o secretário ter com o referido padre e contou-lhe detalhadamente como o irmão lhe descobrira toda a sua vida. “Só Deus ou o demônio, disse, poderia ter-lhe revelado o meu estado; mas como me sinto arrependido e contrito, isso não pode ser obra do demônio”.

— O Padre Fiocchi concordou com a conclusão do secretário arrependido, ouviu-o de confissão e orientou-o na reparação dos seus grandes delitos, impondo-lhe o dever imediato de procurar sua legítima esposa.
Ao entrar novamente na igreja para a santa comunhão o secretário ficou devendo mais um favor assinalado ao nosso santo. Na porta da igreja, Geraldo perguntou-lhe para onde ia: “Vou comungar”, respondeu o secretário. “Mas, replicou o irmão, esquecestes este pecado na confissão, tornai a confessar-vos e então podereis ir tranqüilo à mesa da comunhão”. O penitente obedeceu e teve depois a consolação de comungar na convicção de estar inteiramente reconciliado com Deus.

Essa transformação interior devia necessariamente manifestar-se exteriormente. Os seus sentimentos traíram-no logo em todo o seu procedimento; o homem outrora tão expansivo tornou-se sério, silencioso e reconcentrado; viram-no muitas vezes derramar lágrimas e soluçar. É escusado dizer que isso causou estranheza geral. O arcebispo que nada suspeitava, chamou-o e perguntou-lhe pela causa de tão estranha transformação. A resposta foi além de uma torrente de lágrimas a palavra da samaritana, a quem Jesus revelara os pecados ocultos: “Vinde ver o homem, que me disse tudo o que tinha feito”, confessou sinceramente ao arcebispo o estado anterior da sua alma e narrou-lhe o modo como Geraldo o arrancou às sombras da morte em que se achava, despertando em sua alma pensamentos e sentimentos, que antes desconhecia por completo.

A santidade de Geraldo não era desconhecida ao arcebispo; esse fato porém aumentou-lhe consideravelmente o respeito e veneração para com ele. Pediu que lhe contassem circunstanciadamente os prodígios de Geraldo e procurou tirar também proveito da sabedoria celeste do irmão. — Em suas palestras com o servo de Deus, não poucas vezes chorou de comoção e contentamento. Embora de natural retraído desfez-se na hora da despedida em provas manifestas de afeição ao santo, recomendando-se às suas orações. O irmão confundido com tantas atenções respondeu: “Excelência, eu preciso de toda a misericórdia divina para salvar a minha alma; peço-vos que vos lembreis de mim ao altar”.

O secretário, ao voltar à residência do arcebispo, causou estranheza geral. “Que é isso, perguntou-lhe um dia o diretor do seminário, já vos não vejo no bom humor de outrora, e não me posso explicar o motivo”. — Naturalmente, respondeu este, não sabeis o que se passou comigo em Caposele! Ah! meu amigo, não sou solteiro, como pensais, e o Irmão Geraldo pôs-me ante os olhos o estado deplorável da minha alma”. O arcebispo não o reteve mais muito tempo, enviou-o a Roma com uma carta de recomendação a Mons. Casone, seu parente.
Também lá narrou o convertido o que se dera com ele no convento dos redentoristas de Caposele, e o que o chamava a Roma; isso conquistou ao santo veneradores e admiradores também na capital do mundo católico. Além disso o manteve piedosa correspondência epistolar com o santo até a morte deste.

Em um colóquio com um cardeal de Roma relatou-lhe Mons. Casone, entre outras coisas, o ocorrido com o secretário do arcebispo de Conza. O cardeal, admirado, manifestou desejo de conhecer o Irmão Geraldo, escreveu expressamente ao arcebispo pedindo-lhe mandá-lo a Roma; mas quando a carta chegou, o santo já não estava entre os vivos.

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